segunda-feira, 30 de junho de 2008

Para gostar de ler (Continuação do post anterior)


ilustração: Erkut Terliksiz

Para mim, ler um bom livro traz uma felicidade superior à dos que amam velocidade, ou plantas, ou baladas, ou praticar exercícios ou de fazer compras. Eu gosto e faço outras coisas que julgo boas, mas volto sempre à minha estante com seus segredos e cheiros de papel velho.
Acho que há diferença na vida de um homem que não lê e na do outro que lê. Quando conheço alguém já penso: esse aí lê. Em geral o homem (e mulher) que lê é um homem cuja conversa tem sabor – e isso o deixa mais bonito. Já os outros me dão a impressão de estarem presos a um mundo imediato muito restrito, quase uma prisão corporal, não importa o quanto viajaram ou quais lugares freqüentam. Não há como escapar dessa prisão. Mas quando pega um livro, ele tem em suas mãos outro mundo - e se o livro é bom, tem também um dos melhores companheiros conversadores que se pode ter.

Não há programa de tevê, música ou internet que substitua a leitura. Os filmes podem tentar reproduzir o universo de um livro, mas quase nunca chegam perto. Já o livro o obriga a imaginar, transportando-o muitas vezes a um país ou época diferentes, ou lhe confia alegrias e tristezas, ou discute um aspecto da vida que o leitor ainda nem sabe. Essa mudança de época e de ambiente é algo semelhante a uma viagem em seu aspecto psicológico. Essa é a melhor leitura: a que nos leva a um mundo contemplativo e não a que apenas relata os fatos, como a de jornais. Não é essa a leitura que falo aqui.

Quando não se deve ler

Por obrigação. Você não deve ler para “melhorar” o vocabulário ou tornar-se “culto”. Só de pensar nisso já desaparece todo o prazer da leitura. Se alguém diz: devo ler Machado de Assis para ser culto, estou certa de que esse alguém nunca será culto. E se a leitura provocar sono é bom mesmo ir dormir. Não há escola particular de mensalidade exorbitante que possa fazer alguém amar uma obra. Acredito que se possa “descobrir” o prazer da leitura, sim. Os nossos interesses culturais brotam naturalmente, quando há um terreno fértil.

Ler o quê?

O gosto (ou podemos aqui chamar de sabor) pela leitura é completamente individual, como o paladar. Isso é outra coisa que não há como forçar. Também acho que em certas idades não deve-se ler certas coisas. Acredito em momento certo. Quando os pensamentos e a experiência de uma pessoa não chegaram a certo ponto para ler uma obra-prima, esta só lhe deixará um gosto ruim. Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato é um livro que não poderia ser lido por mim senão na infância, pois perderia muito da sua magia.
Conforme torna-se um hábito, o leitor vai descobrindo o seu autor (ou autores) preferido(s). Considero esse um momento de amor à primeira vista. E esse descobrimento, para fazer bem, deve ser natural. Logo começa o leitor a devorar cada palavra. Pronto: o autor o enfeitiçou!

Momento e lugar

Não há nenhum lugar ou tempo específico para ler. Você deve ler quando tem vontade de ler. Se você ama a leitura vai ler na escola ou fora dela, e apesar dela.
Um lugar silencioso pode ser bacana, mas se não houver vontade, de nada adiantará o silêncio. Eu já li pelada no verão, por exemplo, mas acho que o inverno combina mais com os livros. Já se o lugar é espetacular, como uma bela praia, recomendo ler o mar e esquecer o livro. Aproveite a areia e a água azul.

Por fim, acho triste que o hábito de ler tenha virado sinônimo de chatice para algumas pessoas, como se um livro tivesse de ser algo muito complicado e de difícil compreensão. Isso é uma bobagem. A minha faxineira disse que não gosta de ler, mas ADORA o popular Sidney Sheldon. Disse a ela que, se ela gostava de seus livros, então gostava de ler. Ela respondeu: ah, é mesmo! Não tinha se dado conta de que gostava de ler.

9 Comentários:

Às 30 de junho de 2008 às 14:51 , Blogger Babi Oliveira disse...

Eu não sou a mais fãn de livros!
Mas aprecio os bons livros também...Aliás, estou esperando o meu! ... Ainda não peguei! Leitura e imaginação... não existe separação.. realmente. Esse post diz tudo aquilo que as professoras de literatura tentaram me dizer em todo meu colegial! HAHA..
Sou obrigada a concordar com a parte dos homens que leem... Não precisa ser um louco pelo mesmo, nem fanático.. ou leitor diário, mas só de ser alguém que sabe o que significa, ou já praticou, enfim.. muda.. MUITO! :) definitivamente... é como melhorar o recheio! HAHAHA

 
Às 30 de junho de 2008 às 15:16 , Anonymous Anônimo disse...

"Se você ama a leitura vai ler na escola ou fora dela, e apesar dela."

Infelizmente, acho que a maior parte das pessoas que gostam de ler lêem APESAR da escola.

Eu adoro ler, você sabe. E fico imaginando cenas em sebos e livrarias delícia como as que tem perto aí da sua casa...

Uma coisa que eu sempre pensei, embora muita gente não aceite, é que não há quem não goste de ler. Há quem não tenha encontrado os livros certos.

Falou tudo, Moniquets. Minhas amigas só me dão orgulho! ;)

 
Às 30 de junho de 2008 às 17:53 , Anonymous Anônimo disse...

Adorei o texto. Não sei bem porque gosto dos livros. talvez porque eles sejam parecidos comigo, mudos, calmos na superfície e loucos em seu interior. Talvez.

beijo

 
Às 1 de julho de 2008 às 15:24 , Anonymous Anônimo disse...

Não ler? Impensável. Seria viver pela metade, talvez menos. Ler é viajar mil vezes, é chegar onde nenhum meio físico de locomoção nos poderia levar. É ter o universo nas mãos sem ter que mover as pernas! Enfim, é quase tudo. Basta espiar pela janela que se abre quando a primeira folha é virada.
Fófis

 
Às 2 de julho de 2008 às 11:33 , Anonymous Anônimo disse...

a história do livro a que a bárbara refere-se aí em cima daria um BOM livro, isso sim.

concordo incondicionalmente com a carlinha. todo livro tem o seu leitor, basta procurar "just a little bit harder".

társis, você é meio louco na superfície também, não? hehe...

e o fófis tá certo. não dá pra não ler...

 
Às 6 de julho de 2008 às 11:28 , Blogger Unknown disse...

Olá, Mô, Mô. Como tem passado? Ando com saudades!!! Pretendo trabalhar seu texto em sala de aula. É impressionante como as pessoas não tem hábito de leitura. Não é a toa que o analfabetismo funcional é altíssimo no Brasil. Um país só terá futuro com educação. Infelizmente estamos longe disso. Lê é descobrir um novo universo, é viajar num mundo paralelo, é ser livre como as personagens. Valeu!!! Quero vê-la nessas férias!!! Dedé

 
Às 9 de julho de 2008 às 06:59 , Blogger Beto Palaio disse...

Maria, ficou legal isso: "já li Pelada no Verão"... O duplo sentido é promissor...

 
Às 11 de julho de 2008 às 11:23 , Anonymous Anônimo disse...

betão, eu simplesmente já li pelada no verão mesmo. quanto ao (duplo)sentido, é interessante quando os leitores o percebem (ou não). Ou mesmo percebem além.
obrigada pelo comentário.

 
Às 19 de novembro de 2009 às 21:22 , Anonymous Anônimo disse...

Aprendi muito

 

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial