Correspondência
obra: Tomie Ohtake
1o mês – Ontem eu recebi uma carta do “diabo”. Ia rasgar, mas não. Envelope em forma de coração. Apartamento 32, pavilhão sete, com amor. Amor de homem não presta. Não fosse ele e eu não estaria nessa ratoeira. Também não teria conhecido Lucinha, minha esposa, minha coisinha. “Nada vai nos separar”, escreveu. Já separou, e foi o bagulho que ele me fez levar. E eu levei. Quando sair nem quero saber. O homem é o cão.
2o mês – Foi ruim de sair. Lucinha chorou. Não posso ver ninguém chorar. Vou esperar por ela, é um amor de carinho. Outra carta. “Carteiro, vá com deus”, o demônio escreveu fora do envelope, para dentro falar de solidão e tristeza. Quer me ver. Em folha separada, uma poesia bonita. Na cadeia até o diabo vira poeta. Mas continuo sem querer saber de homem. Credo.
3o mês – Outra carta, artigo de revista com salmo da bíblia. Artigo 157 é o dele, que teve saidinha por bom comportamento. Chorou tão sentido quando me viu, não posso ver ninguém chorar. Não dei conta de resistir. E eu tava precisando, lá isso eu tava. A Lucinha não tem a ferramenta, né? Mas foi só um dia. Homem não respeita a gente.
4a mês – Dia de visita, céu azul. Acordei duas da manhã, porque a fila pra ver bandido é grande. Abre bolsa, tira roupa, abre a perna, abre tudo. Tudo isso pra ver o diabo. Não volto nunca mais.
5o mês- Peguei o exame no mesmo dia em que descobri que ele mandou a carta pra Elisângela. E pra Jaqueline. A carta era igualzinha: a poesia, o coração. A outra também fez o filho na cadeia. É por isso que eu digo. Enfim, não quero mais saber de homem. Lucinha saiu, vamos nos casar. Ela vai cuidar do meu filho comigo.
6a mês – Ontem eu recebi outra carta do diabo. Ele quer conhecer o filho. Diz que chora muito. Pensando bem, tem o seu direito. Lucinha não pode saber, mas nem pega nada porque é só uma visita. Só uma.
2o mês – Foi ruim de sair. Lucinha chorou. Não posso ver ninguém chorar. Vou esperar por ela, é um amor de carinho. Outra carta. “Carteiro, vá com deus”, o demônio escreveu fora do envelope, para dentro falar de solidão e tristeza. Quer me ver. Em folha separada, uma poesia bonita. Na cadeia até o diabo vira poeta. Mas continuo sem querer saber de homem. Credo.
3o mês – Outra carta, artigo de revista com salmo da bíblia. Artigo 157 é o dele, que teve saidinha por bom comportamento. Chorou tão sentido quando me viu, não posso ver ninguém chorar. Não dei conta de resistir. E eu tava precisando, lá isso eu tava. A Lucinha não tem a ferramenta, né? Mas foi só um dia. Homem não respeita a gente.
4a mês – Dia de visita, céu azul. Acordei duas da manhã, porque a fila pra ver bandido é grande. Abre bolsa, tira roupa, abre a perna, abre tudo. Tudo isso pra ver o diabo. Não volto nunca mais.
5o mês- Peguei o exame no mesmo dia em que descobri que ele mandou a carta pra Elisângela. E pra Jaqueline. A carta era igualzinha: a poesia, o coração. A outra também fez o filho na cadeia. É por isso que eu digo. Enfim, não quero mais saber de homem. Lucinha saiu, vamos nos casar. Ela vai cuidar do meu filho comigo.
6a mês – Ontem eu recebi outra carta do diabo. Ele quer conhecer o filho. Diz que chora muito. Pensando bem, tem o seu direito. Lucinha não pode saber, mas nem pega nada porque é só uma visita. Só uma.
3 Comentários:
Muito bem feito da pra situar e imaginar o que está acontecendo pelos fragmentos
Muito bom. Não pare de escrever.
Gostei do estilo. Fácil de ler e de se sentir parte integrante da narrativa
Luiz Carlos
Obrigada Alvaro! Saudades docê.
Luiz Carlos: elogio de marido é suspeito..hehe. Obrigada por existir.
Brigada pessoal. Beijo grande!
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