Do talento para a música
A contragosto, Chesney o trocou por um trompete. Trouxe- o para casa e colocou-o friamente sobre um móvel, sem nem querer entregá-lo ao garoto. Pelo resto da vida, Vera**alegava que seu filho só precisou de duas semanas para aprender a tocar “Two O´Clock Jump”. A maioria dos músicos aprende seu ofício por meio de uma combinação de prática e estudo e das complexidades de técnica e teoria, mas aquela não era a abordagem de Chet Baker para com a música ou a vida. (...) “Ele não sabia o que estava fazendo naquele nível, nunca. Ele simplesmente fazia.”
Mal havia demonstrado todo seu futuro musical e o desastre aconteceu. Brincando na rua depois das aulas com os amigos da vizinhança, um deles jogou uma pedra num poste de iluminação. A pedra ricocheteou e atingiu Chettie na boca, quebrando seu dente esquerdo da frente. Chesney ficou enraivecido, gritando que o garoto nunca mais conseguiria tocar o trompete de novo. Chettie não podia entender a confusão; não sabia que era quase impossível controlar o fluxo de ar num instrumento de sopro de bocal sem um dente da frente. Praticou com tanta tenacidade que transformou a falha dental em parte da sua técnica.
(...) Na escola de Glendale, o adolescente matriculou-se num curso de treinamento instrumental básico, mas aquilo o entediava. Dominava cada exercício em minutos e não tinha paciência para estudar pelos livros. Parecia-lhe um desperdício de tempo memorizar bolinhas e rabiscos complicados num pentagrama; por que se dar ao trabalho se era capaz de aprender uma canção ouvindo-a uma ou duas vezes? Tocando na banda dançante da escola, aprendeu de ouvido as marchas de Sousa e depois fingia que lia a partitura.”
Trecho da ótima biografia "No Fundo de Um Sonho - A Longa Noite de Chet Baker" de James Gavin (Companhia das Letras), sobre o famoso trompetista de jazz dos anos 50. Talentoso, lindo e viciado em heroína, Chet morreu em 1988 ai cair da janela de um hotel em Amsterdã, em circunstâncias até hoje não esclarecidas.
Para mim, sua música é diferente cada vez que a ouço. E linda.
** Vera Baker, mãe de Chet
2 Comentários:
Prodígio e talentosíssimo...
Quem tocou com Stan Getz e Charlie Parker entre tantos outros só poderia ser mestre..
Monica, valeu a ilustração, ainda não li este livro e pelo jeito será uma próxima leitura.
Ate
Fê, o livro é maravilhoso - e mostra, além do talento indiscutível de Chet, o lado tenebroso e autodestruidor do gênio com cara de bebê.
mas vale muito!
obrigada pela visita.
bj.
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