segunda-feira, 26 de abril de 2010

Do talento para a música


Chet Baker, trágica beleza mágica. Foto: Fan Pix
“Em 1943, parou numa loja de penhores quando voltava da fábrica para casa. Com Jack Teagarden* na cabeça, comprou um trombone e o deu para o filho. Foi uma escolha insensível: com a vara estendida, o instrumento era quase da altura de Chettie, que não teria como manipulá-lo.

A contragosto, Chesney o trocou por um trompete. Trouxe- o para casa e colocou-o friamente sobre um móvel, sem nem querer entregá-lo ao garoto. Pelo resto da vida, Vera**alegava que seu filho só precisou de duas semanas para aprender a tocar “Two O´Clock Jump”. A maioria dos músicos aprende seu ofício por meio de uma combinação de prática e estudo e das complexidades de técnica e teoria, mas aquela não era a abordagem de Chet Baker para com a música ou a vida. (...) “Ele não sabia o que estava fazendo naquele nível, nunca. Ele simplesmente fazia.”

Mal havia demonstrado todo seu futuro musical e o desastre aconteceu. Brincando na rua depois das aulas com os amigos da vizinhança, um deles jogou uma pedra num poste de iluminação. A pedra ricocheteou e atingiu Chettie na boca, quebrando seu dente esquerdo da frente. Chesney ficou enraivecido, gritando que o garoto nunca mais conseguiria tocar o trompete de novo. Chettie não podia entender a confusão; não sabia que era quase impossível controlar o fluxo de ar num instrumento de sopro de bocal sem um dente da frente. Praticou com tanta tenacidade que transformou a falha dental em parte da sua técnica.

(...) Na escola de Glendale, o adolescente matriculou-se num curso de treinamento instrumental básico, mas aquilo o entediava. Dominava cada exercício em minutos e não tinha paciência para estudar pelos livros. Parecia-lhe um desperdício de tempo memorizar bolinhas e rabiscos complicados num pentagrama; por que se dar ao trabalho se era capaz de aprender uma canção ouvindo-a uma ou duas vezes? Tocando na banda dançante da escola, aprendeu de ouvido as marchas de Sousa e depois fingia que lia a partitura.”


Trecho da ótima biografia "No Fundo de Um Sonho - A Longa Noite de Chet Baker" de James Gavin (Companhia das Letras), sobre o famoso trompetista de jazz dos anos 50. Talentoso, lindo e viciado em heroína, Chet morreu em 1988 ai cair da janela de um hotel em Amsterdã, em circunstâncias até hoje não esclarecidas.

Para mim, sua música é diferente cada vez que a ouço. E linda.

*trombonista americano famoso nos anos 40, de quem o pai de Chet era fã.

** Vera Baker, mãe de Chet

2 Comentários:

Às 26 de abril de 2010 às 06:33 , Blogger Fhenso Funk Music disse...

Prodígio e talentosíssimo...

Quem tocou com Stan Getz e Charlie Parker entre tantos outros só poderia ser mestre..

Monica, valeu a ilustração, ainda não li este livro e pelo jeito será uma próxima leitura.

Ate

 
Às 27 de abril de 2010 às 07:37 , Anonymous Maria-Sem-Vergonha disse...

Fê, o livro é maravilhoso - e mostra, além do talento indiscutível de Chet, o lado tenebroso e autodestruidor do gênio com cara de bebê.
mas vale muito!

obrigada pela visita.

bj.

 

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