O Gato Azul
Continho antigo..
Começou na escola. As crianças que eu não gostava eram a maioria. De quem eu gostava mesmo? Ah, eu deixava um garoto brincar com o gato azul de borracha. Ninguém gostava do garoto. Primeiro, porque era preto. E depois porque levava muitas broncas das tias. Às vezes ele aparecia com seu sorriso fácil e seus modos gentis, era bom de brincar. Até que um dia ele não veio. E nem no outro, e no outro e no outro. Então brincávamos eu e o gato, que se chamava gato azul mesmo, todos os dias, embaixo da árvore mais afastada do pátio. Era um pátio com diversas árvores, muitos brinquedos, e eu era responsável pelo gato. Eu não pedia o seu amor. Eu o alimentava com a areia do pátio e o amava, simplesmente. Juntos viajávamos e conversávamos sobre o que queríamos. Era bem mais legal que as crianças e eu preferia estar sozinha com ele.
Acontece que a mãe verdadeira do gato azul era uma garotinha chata que nada entendia de amar gatos. Quando deu de passar por lá, me viu com o gato azul no colo. E brigou e gritou e disse olha você nunca mais brinque com os meus brinquedos sua “ladrona”! Arrancou-o de mim com raiva e unhas grandes deixando um vazio insubstituível. Senti-me tão sozinha que permaneci imóvel até o final do recreio. No dia seguinte a garota tinha jogado o gato azul de novo na areia, ela realmente não entendia nada de amar gatos. Eu o resgatei e o levei de volta ao nosso lugar preferido, onde ele gostava de ficar de verdade. Desta vez me escondi atrás da árvore em silêncio.
O tempo passou, as escolas mudaram, mas eu não. Outros recreios vieram, era melhor estar sozinha. Quando os peitos cresceram, os meninos se aproximaram. Alguns tão bobos, era melhor estar sozinha. Vieram os empregos, a faculdade, os amores, poucos amigos. Um pedido de casamento. Achei que ele não me deixaria ficar sozinha na última árvore do pátio. Morei no branco, no gelo. Gostei de estar sozinha porque ficava ainda mais feliz quando, finalmente, alguém aparecia. Troquei o casamento por cds de jazz e livros, além de garrafas de vinho. A árvore virou um apê pequeno, porém aconchegante. O telefone toca muito e a secretária atende. É melhor estar com a solidão, uma senhora paciente e muito distinta. Mas sabe, sinto mesmo é saudade do gato azul. Puxa, que falta ele faz...
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