Brincando nos Campos do Senhor*
O céu refletia nas águas e a sensação era a de estar suspenso
Não sou do tipo que procura explicações do além para o que acontece. Não acredito em horóscopo, não enxergo sinais em pombas paradas, objetos que quebram, essas coisas. Nunca gostei quando as pessoas atribuem a Deus tudo o que é desgraça. “Porque Deus quis”. Pois se Deus fosse responsável por certas bárbaries, mais um motivo para desprezá-lo.
Como citei no post anterior, eu e meu marido fizemos uma viagem onde descobrimos o Brasil (a maior parte dele, o Brasil de verdade). Já que eles – a região norte e nordeste – são maioria; “pronto”, como costumam dizer. Não há o que discutir: são os representantes do nosso país, por mais outros cartões postais símbolos que possa existir.
Nesta odisseia, nada de roteiros turísticos. Acampar na selva amazônica, conhecer o agreste nordestino, sem praia, sem barzinho da moda ou galerinha queimada de sol. Os amigos meteram o pau. Certas pessoas são escravas incondicionais do conforto – o que quer que isso signifique.
No Aurélio, conforto (sm) é: ato ou efeito de confortar(-se). Consolo, alívio. 2 Bem-estar material; comodidade. Uma cama espaçosa e limpa? Um banho quente? Um condomínio com brinquedoteca para os filhos brincarem “seguros”? Aquecedor ou sapato velho? Seja lá o que for, impossível viver sem ele.
Quando atravessamos a balsa em Castanho, município do Amazonas, e chegamos no Rio Tupana, já começávamos a mudar. Foram 178 quilômetros de Manaus, a capital. Engraçado, tanta gente busca uma transformação sincera na vida. Algumas pessoas se esforçam durante anos e permanecem perdidas. Pra outras, o objetivo conquistado é uma decepção.
Mas pra mim, que não queria nada, ela simplesmente aconteceu. Como quando esses evangélicos dizem que “aceitaram Jesus”. E sim, respeito do fundo do coração esse tal insight, pois passei por ele. Eu, a cética.
Para começar, o choque: sou de São Paulo, nascida e criada. Tenho curso superior, me viro bem no inglês, vou ao teatro. Sempre gostei da minha cidade, já arrumei briga por causa dela. Adoro o meu bairro e a minha casa que até aquele momento, não trocaria por nada. Até aquele momento.
Em alguns segundos, aprendi tudo de novo. Todos os filmes que assisti, o rock inglês que sempre gostei, as baladas que freqüentei. A infinidade de livros que li. Tudo aquilo não era nada. Eu era uma criança sendo apresentada ao mundo que é meus, mas não conhecia: as imensas árvores, que por ser época de cheia, dava pra tocar nas copas. Eles chamam de igarapés. Todos esses nomes indígenas têm significados bem simples – e fico pensando como eles chegaram à origem desses nomes, de que forma foram passados de boca em boca entre as tribos, até cada um deles estabelecer-se como definitivo.
Mas isso foi só o começo.
Fomos recebidos com suco de cupuaçu – nem preciso dizer que não era de polpa.
Dava pra sentir os pedaços da fruta. Pedir uma coca-cola naquele lugar era como pedir um filé em um restaurante vegan. Quase nojento.
Tampouco fazia sentido ser vegetariano. Pode ter nexo na cidade, onde o alimento vem de abates escrotos. Não ali. A lei da sobrevivência é essa, todos comem todos. Nas cheias, quando falta peixe, os ribeirinhos caçam jacaré e macaco. Parece absurdo não? Mas esta simples regra, seguida à risca, não ameaçaria nenhum animal de extinção.
Já nós, comemos peixe: Tucunaré, Tambaqui, Matrinxã. Macaxeira para acompanhar, tapioca de sobremesa.
O guia do passeio, um índio de Roraima da tribo apixana, batizado de Kennedy – e que teve a sorte de aprender com seus ancestrais, como nos contou, inúmeras manhas de bem viver – tentou capturar um jacaré. O objetivo era mostrá-lo de perto e depois devolver ao meio ambiente. Cheguei a vê-los, mas a caça fracassou. Senti um alívio. Tínhamos companheiros naquela excursão e não manifestei o meu desejo, mas queria deixar os bichos em paz. Imagine entrar em uma casa onde a dona é toda limpinha e jogar um papel de bala no meio do piso brilhante. Eu não queria bagunçar aquele templo.
A canoa era a única forma de locomoção. De remo, como fazem os ribeirinhos. Nestas horas aconteciam as mágicas. Com sol ou chuva, o céu e as árvores refletiam nas águas transparentes, o que tornava tudo uma coisa só. Então a sensação era a de estar voando e até o corpo ficava mais leve. Tudo imenso, o universo. Eu parte dele e ao mesmo tempo tão pequena, nada. Inferior talvez a milhares de pássaros de todas as cores e desenhos. Ou bando deles. Quão bonito é ver um bando de pássaros cantando felizes – e SOLTOS.
Se existe o céu católico, duvido que seja melhor.
Mas o choque maior veio depois. Na pousada. No banho de rio e nos pés de frutas. Nos bandos de macacos – prego, barrigudo. Pensei em minha vida em São Paulo. Pensei em pessoas que conheço. Nos valores destrutivos que passam a seus filhos. No grande número de inutilidades que consumimos para tapar um buraco fundo, que apareceu quando nos foi tirado o convívio essencial com a natureza de onde viemos.
Mas não adianta: carro grande, design avançado, condomínio com piscina, escova de cabelo, chapinha, bolsa de “croco”, Prada e Rolex. Celulares e botas de camurça. TV LCD. Motocicletas. Orkut, msn, twitter. Restaurante e pet shop. Absorvemos como esponja e sem questionamento. Todos os recursos ilusórios para esquecermos – ou nunca sabermos – do óbvio: viemos do mesmo lugar dos animais que vi na terra, na água e no ar. Compreender a inutilidade de todas essas coisas causa uma certa infelicidade, mas não há volta.
Continuamos acampados e à noite, quando as velas se apagam, está escuro como breu. O Kennedy nos conta a sua história, como aprendeu o português e o seu idioma “apixana”. Da sua avó, ensinando a fazer fogueira com Breu Branco e tomar água em árvore (tem uma árvore da qual sai água, é sério), a chamar os companheiros da tribo pelo toque da sapopema (saliência do tronco) do Arara-Tucupi. E são tantos os nomes de tantas espécies. E são tantos os barulhos. Sem saber de onde vinham, deu medo. Mas só estavam avisando um ao outro que o pior bicho, o homem, estava por perto. Cinco deles e eu, a única mulher. Mas naquele instante, todos igualmente vulneráveis.
As árvores estão ali, prontas para servir e curar. Ou pra abortar com Carapan-Ubá, de onde se extrai a quinina, como faziam as índias. Ah, eu poderia aprender o dia todo sobre a selva. Afinal estou atrasada. Tive a vida toda pra saber, e nunca soube.
Hora de voltar. A paisagem confunde a rota, mas o Kennedy desvenda a floresta. Ela parece não ter nenhum mistério para ele, mas é só impressão: já se perdeu também. A natureza não perdoa nunca.
Eis que algo que muda a ordem das coisas: Conchita, a macaca que sobe no meu colo feliz, catando piolhos. A história é que ela foi encontrada depois que a mãe morreu (ou será que mataram a mãe para capturá-la? Faltou coragem pra saber) e criada desde pequena. Mas Conchita estava em casa. Diferente daqueles que compram animais selvagens como souvenirs. Os infelizes que citei lá em cima, lembram?
Hora de conhecer os ribeirinhos e sua rotina regada a calmaria; sem geladeira, sem água quente e sem cheese cake. Eles não têm consciência da vida imensamente boa que levam. Eles precisam de pouco, como deve ser.
Um cuidado importante: gotas de cloro na água, um conhecimento adquirido e abençoado.
Ah, o conhecimento. Todos ali tão ávidos pelo desconhecido. A cidade, a saúde, a medicina. Nisso sou a favor do progresso: não há nada de errado em transmitir o que se sabe. Há uma escola e as crianças, que às vezes demoram três horas para chegar nela, são sedentas por aprender. Embora ainda falte aos pais humildes o alcance da importância de se saber ler e escrever. Mesmo na selva. Um povo que não sabe ler e escrever é fácil de enganar, disse Che, que por sinal viveu muito tempo na selva.
Conheci Ana de sete anos. Sua mãe a quis me “dar”, como quem dá um presente. Ana cuidava de seus irmãos como adulta, brincava pouco. Perdendo a infância? Não sei. E os filhos da cidade, não estão? Fiquei comovida por Ana. Alguns pais conseguem transformar os filhos em seres horripilantes, mas isso não fazia parte de seu universo amazônico.
Uma criança adorável, incapaz de qualquer birra besta de quem, vítima do meio, está predestinada ao apego do inútil.
O último dia parecia que ia ser igual aos outros. Mas nada é igual na Amazônia. No entardecer de céu limpo, um arco-íris inteiro (e não só a pontinha, como é costume ver) com mais cores do que aquela caixa de lápis da minha infância. E à noite, um céu cheio de estrelas que não paravam de piscar – e refletiam no rio a felicidade de estar vendo tudo aquilo de cima, na harmonia que (aí sim) Deus quis.
Volto pra São Paulo e, no jornal, um comentário sobre o restaurante da moda, caríssimo. O chef procura utilizar “ingredientes típicos da culinária brasileira”. Entre eles, alguns peixes que comi por lá e iguarias como tapioca e a manteiga de garrafa (que cansei de achar no nordeste por uma ninharia) a um preço exorbitante. Não segurei a gargalhada.
Depois, resisti pra entrar na lan house. Mas acompanhei o meu marido. Digitei o endereço do Twitter. Naquele instante, não poderia haver nada mais superficial e inútil, até deprimente. Eu mudei.
Lembrei de uma reportagem sobre uma alta executiva espanhola que largou tudo pra viver numa vila de pescadores quase deserta na Bahia. Por que não eu? Levei a ideia pro meu marido, esperando um esculacho. Ele topou. Na verdade, acho que pensou a mesma coisa que eu.
Chega de artifícios, quero viver de verdade.
* Nome de um filme do diretor argentino Hector Babenco
Como citei no post anterior, eu e meu marido fizemos uma viagem onde descobrimos o Brasil (a maior parte dele, o Brasil de verdade). Já que eles – a região norte e nordeste – são maioria; “pronto”, como costumam dizer. Não há o que discutir: são os representantes do nosso país, por mais outros cartões postais símbolos que possa existir.
Nesta odisseia, nada de roteiros turísticos. Acampar na selva amazônica, conhecer o agreste nordestino, sem praia, sem barzinho da moda ou galerinha queimada de sol. Os amigos meteram o pau. Certas pessoas são escravas incondicionais do conforto – o que quer que isso signifique.
No Aurélio, conforto (sm) é: ato ou efeito de confortar(-se). Consolo, alívio. 2 Bem-estar material; comodidade. Uma cama espaçosa e limpa? Um banho quente? Um condomínio com brinquedoteca para os filhos brincarem “seguros”? Aquecedor ou sapato velho? Seja lá o que for, impossível viver sem ele.
Quando atravessamos a balsa em Castanho, município do Amazonas, e chegamos no Rio Tupana, já começávamos a mudar. Foram 178 quilômetros de Manaus, a capital. Engraçado, tanta gente busca uma transformação sincera na vida. Algumas pessoas se esforçam durante anos e permanecem perdidas. Pra outras, o objetivo conquistado é uma decepção.
Mas pra mim, que não queria nada, ela simplesmente aconteceu. Como quando esses evangélicos dizem que “aceitaram Jesus”. E sim, respeito do fundo do coração esse tal insight, pois passei por ele. Eu, a cética.
Para começar, o choque: sou de São Paulo, nascida e criada. Tenho curso superior, me viro bem no inglês, vou ao teatro. Sempre gostei da minha cidade, já arrumei briga por causa dela. Adoro o meu bairro e a minha casa que até aquele momento, não trocaria por nada. Até aquele momento.
Em alguns segundos, aprendi tudo de novo. Todos os filmes que assisti, o rock inglês que sempre gostei, as baladas que freqüentei. A infinidade de livros que li. Tudo aquilo não era nada. Eu era uma criança sendo apresentada ao mundo que é meus, mas não conhecia: as imensas árvores, que por ser época de cheia, dava pra tocar nas copas. Eles chamam de igarapés. Todos esses nomes indígenas têm significados bem simples – e fico pensando como eles chegaram à origem desses nomes, de que forma foram passados de boca em boca entre as tribos, até cada um deles estabelecer-se como definitivo.
Mas isso foi só o começo.
Fomos recebidos com suco de cupuaçu – nem preciso dizer que não era de polpa.
Dava pra sentir os pedaços da fruta. Pedir uma coca-cola naquele lugar era como pedir um filé em um restaurante vegan. Quase nojento.
Tampouco fazia sentido ser vegetariano. Pode ter nexo na cidade, onde o alimento vem de abates escrotos. Não ali. A lei da sobrevivência é essa, todos comem todos. Nas cheias, quando falta peixe, os ribeirinhos caçam jacaré e macaco. Parece absurdo não? Mas esta simples regra, seguida à risca, não ameaçaria nenhum animal de extinção.
Já nós, comemos peixe: Tucunaré, Tambaqui, Matrinxã. Macaxeira para acompanhar, tapioca de sobremesa.
O guia do passeio, um índio de Roraima da tribo apixana, batizado de Kennedy – e que teve a sorte de aprender com seus ancestrais, como nos contou, inúmeras manhas de bem viver – tentou capturar um jacaré. O objetivo era mostrá-lo de perto e depois devolver ao meio ambiente. Cheguei a vê-los, mas a caça fracassou. Senti um alívio. Tínhamos companheiros naquela excursão e não manifestei o meu desejo, mas queria deixar os bichos em paz. Imagine entrar em uma casa onde a dona é toda limpinha e jogar um papel de bala no meio do piso brilhante. Eu não queria bagunçar aquele templo.
A canoa era a única forma de locomoção. De remo, como fazem os ribeirinhos. Nestas horas aconteciam as mágicas. Com sol ou chuva, o céu e as árvores refletiam nas águas transparentes, o que tornava tudo uma coisa só. Então a sensação era a de estar voando e até o corpo ficava mais leve. Tudo imenso, o universo. Eu parte dele e ao mesmo tempo tão pequena, nada. Inferior talvez a milhares de pássaros de todas as cores e desenhos. Ou bando deles. Quão bonito é ver um bando de pássaros cantando felizes – e SOLTOS.
Se existe o céu católico, duvido que seja melhor.
Mas o choque maior veio depois. Na pousada. No banho de rio e nos pés de frutas. Nos bandos de macacos – prego, barrigudo. Pensei em minha vida em São Paulo. Pensei em pessoas que conheço. Nos valores destrutivos que passam a seus filhos. No grande número de inutilidades que consumimos para tapar um buraco fundo, que apareceu quando nos foi tirado o convívio essencial com a natureza de onde viemos.
Mas não adianta: carro grande, design avançado, condomínio com piscina, escova de cabelo, chapinha, bolsa de “croco”, Prada e Rolex. Celulares e botas de camurça. TV LCD. Motocicletas. Orkut, msn, twitter. Restaurante e pet shop. Absorvemos como esponja e sem questionamento. Todos os recursos ilusórios para esquecermos – ou nunca sabermos – do óbvio: viemos do mesmo lugar dos animais que vi na terra, na água e no ar. Compreender a inutilidade de todas essas coisas causa uma certa infelicidade, mas não há volta.
Continuamos acampados e à noite, quando as velas se apagam, está escuro como breu. O Kennedy nos conta a sua história, como aprendeu o português e o seu idioma “apixana”. Da sua avó, ensinando a fazer fogueira com Breu Branco e tomar água em árvore (tem uma árvore da qual sai água, é sério), a chamar os companheiros da tribo pelo toque da sapopema (saliência do tronco) do Arara-Tucupi. E são tantos os nomes de tantas espécies. E são tantos os barulhos. Sem saber de onde vinham, deu medo. Mas só estavam avisando um ao outro que o pior bicho, o homem, estava por perto. Cinco deles e eu, a única mulher. Mas naquele instante, todos igualmente vulneráveis.
As árvores estão ali, prontas para servir e curar. Ou pra abortar com Carapan-Ubá, de onde se extrai a quinina, como faziam as índias. Ah, eu poderia aprender o dia todo sobre a selva. Afinal estou atrasada. Tive a vida toda pra saber, e nunca soube.
Hora de voltar. A paisagem confunde a rota, mas o Kennedy desvenda a floresta. Ela parece não ter nenhum mistério para ele, mas é só impressão: já se perdeu também. A natureza não perdoa nunca.
Eis que algo que muda a ordem das coisas: Conchita, a macaca que sobe no meu colo feliz, catando piolhos. A história é que ela foi encontrada depois que a mãe morreu (ou será que mataram a mãe para capturá-la? Faltou coragem pra saber) e criada desde pequena. Mas Conchita estava em casa. Diferente daqueles que compram animais selvagens como souvenirs. Os infelizes que citei lá em cima, lembram?
Hora de conhecer os ribeirinhos e sua rotina regada a calmaria; sem geladeira, sem água quente e sem cheese cake. Eles não têm consciência da vida imensamente boa que levam. Eles precisam de pouco, como deve ser.
Um cuidado importante: gotas de cloro na água, um conhecimento adquirido e abençoado.
Ah, o conhecimento. Todos ali tão ávidos pelo desconhecido. A cidade, a saúde, a medicina. Nisso sou a favor do progresso: não há nada de errado em transmitir o que se sabe. Há uma escola e as crianças, que às vezes demoram três horas para chegar nela, são sedentas por aprender. Embora ainda falte aos pais humildes o alcance da importância de se saber ler e escrever. Mesmo na selva. Um povo que não sabe ler e escrever é fácil de enganar, disse Che, que por sinal viveu muito tempo na selva.
Conheci Ana de sete anos. Sua mãe a quis me “dar”, como quem dá um presente. Ana cuidava de seus irmãos como adulta, brincava pouco. Perdendo a infância? Não sei. E os filhos da cidade, não estão? Fiquei comovida por Ana. Alguns pais conseguem transformar os filhos em seres horripilantes, mas isso não fazia parte de seu universo amazônico.
Uma criança adorável, incapaz de qualquer birra besta de quem, vítima do meio, está predestinada ao apego do inútil.
O último dia parecia que ia ser igual aos outros. Mas nada é igual na Amazônia. No entardecer de céu limpo, um arco-íris inteiro (e não só a pontinha, como é costume ver) com mais cores do que aquela caixa de lápis da minha infância. E à noite, um céu cheio de estrelas que não paravam de piscar – e refletiam no rio a felicidade de estar vendo tudo aquilo de cima, na harmonia que (aí sim) Deus quis.
Volto pra São Paulo e, no jornal, um comentário sobre o restaurante da moda, caríssimo. O chef procura utilizar “ingredientes típicos da culinária brasileira”. Entre eles, alguns peixes que comi por lá e iguarias como tapioca e a manteiga de garrafa (que cansei de achar no nordeste por uma ninharia) a um preço exorbitante. Não segurei a gargalhada.
Depois, resisti pra entrar na lan house. Mas acompanhei o meu marido. Digitei o endereço do Twitter. Naquele instante, não poderia haver nada mais superficial e inútil, até deprimente. Eu mudei.
Lembrei de uma reportagem sobre uma alta executiva espanhola que largou tudo pra viver numa vila de pescadores quase deserta na Bahia. Por que não eu? Levei a ideia pro meu marido, esperando um esculacho. Ele topou. Na verdade, acho que pensou a mesma coisa que eu.
Chega de artifícios, quero viver de verdade.
* Nome de um filme do diretor argentino Hector Babenco